A crise chegou e as editoras estão em pânico. As curtíssimas margens de lucro num negócio que pouco tinha de negócio desapareceram num espaço ainda mais curto de tempo. As livrarias não pagam, os leitores não compram. E vai piorar.As pequenas e médias editoras ou têm fundo de maneio que lhes permita aguentar a crise ou vão fechar portas (conheço muito poucas que tenham essa almofada de segurança). O mesmo vai passar-se com as pequenas e médias livrarias.
No que toca às grandes editoras, as soluções dos gestores passam por baixar preços e fazer grandes saldos, medidas inevitáveis para a sobrevivência no momento mas de consequências desastrosas no futuro. Se e quando a crise começar a passar, os alguns anos de preços da chuva, "packs" e saldos vão condicionar os leitores sobreviventes relativamente a preços mais 'verdadeiros'.
Dessa forma quem, apesar da crise, compra ainda livros vai, nos próximos tempos, matar a fome com preços que nunca sonhou. E depois? Haverá ainda espaço e tempo para os novos livros a preços superiores? Esta pergunta será válida para as editoras grandes como para as grandes cadeiras livreiras.
Claro que a crise tem as suas vantagens. A adequação da realidade do output editorial à capacidade de absorção do mercado. Mas se essas realidades estão ambas sob a sombra negrta da crise, como sobreviver?
Caber-me-ia agora indicar que é nestas alturas que se deveria apostar nas linhas de qualidade e na edição com rigor, critério e cuidados especiais. Que vai ser esse tipo de edição que vai garantir o futuro na altura das mudanças que se avizinham. Mas nem os gestores compreendem isso (nunca o compreenderam aliás) nem conseguem perspectivar qualquer opção estratégica que não resulte em retorno imediato - porque a edição em Portugal, dadas as suas margens, não foi nunca pensada num prisma de médio/longo prazo (salvo em casos pontuais).
Não devemos escamotear a verdade: o sector vai ficar moribundo. Vão fechar editoras, distribuidoras, livrarias e mesmo gráficas. Muitas. A maior parte. Vão ficar sem trabalho editores, livreiros, comerciais, tradutores, revisores, técnicos diversos das mais diversas áreas ligadas à edição de livros e sua produção.
Mas se a crise é a principal culpada não podemos também ignorar que a situação acontece pela realidade de um país sem hábitos de leitura, um país onde os agentes da área da edição nunca se uniram em campanhas efectivas de desenvolvimento e angariação de novos leitores. Nunca houve acções integradas e continuadas de impacto nessa área porque a cultura é um bem (muito) acessório. Um país onde, apesar das qualidades notáveis que os portugueses possuem, nunca se tirou delas partido, com um sistema de ensino medíocre que trabalha para a medianização e não para a excelência; um país que nunca soube reconhecer os seus maiores valores e os perde constantemente para o exterior. Um país onde é mais fácil criticar quem se distingue do que valorizar.
Neste quadro não podemos ter esperança no sector editorial e os investimentos nas novas tecnologias do livro, com os valores que implicam, parecem ainda mais incongruentes.
Gostaria muito de estar errado mas fica o aviso: comecem a preparar-se para encomendar livros do Brasil.
9 comentários:
Livros brasileiros ninguém merece! Se bem que com o novo acordo ortográfico já não vá haver muita diferença... mas mesmo assim ver as personagens a tratar-se por você não muito obrigado (entre outras questões claro). É bem verdade que antes comprava todos os livros que queria ler logo que saíam, e agora nem tenho dinheiro para comprar um único livro que ando a querer à muito, nem tenho tempo para ler os que tenho pra prateleira porque a crise faz-nos ter dois trabalhos. Enfim.. vamos torcer para que as editoras se aguentem e nos continuem a publicar grandes títulos, apesar que a preços absurdamente elevados... ou então começem a apostar mais no e-books :)
O problema cara Sofia é que os e-books, com os custos de direitos e tradução vão também ser caros na perspectiva do leitor. A única grande vantagem é que começaremos a ler mais escritores portugueses.
Viva a & ETC!
Do teu assistente editorial (e repara na coragem/audácia/inconsciência de escrever isto numa altura de crise): O 'problema deste país' é pessoas que escrevem coisas como 'neste país'. Sê universal e fala da tua aldeia.
Hugo,
Parabéns pelo excelente post. Fazia falta uma boa dose de realismo num meio que se distrai em devaneios sobre eBook readers e formatos do livro do futuro, ou outras questões acessórias no actual panorama português. As questões que levantas estão muito mais próximas de acontecer do que a revolução do livro digital (pelo menos por cá), e tocam em algo fundamental, que é a vida de muita gente. É de facto um problema deste país, e ainda bem que temos por cá quem o traga para reflexão.
Grande abraço,
Pedro
à sra. Sofia: se acha que com o acordo ortográfico isto fica muito parecido com os brasileiros, aconselho-a a informar-se sobre o acordo e a ligar menos a postas de pescada de intelectuais com direito a tempo de antena. E, já agora, a ver qual a diferença entre sintaxe, léxico e ortografia.
Caro último anónimo antes deste meu comentário. Em primeiro lugar concordo inteiramente. Em segundo lugar discordo inteiramente de como o diz.
É uma coisa de bom tom que se deve respeitar os outros sobretudo quando não os conhecemos. E este é um espaço para troca de ideias sobretudo porque me parece perfeitamente plausível que as troquemos Seria até bom que, caso entendesse, explicasse o porquê da sua resposta - que eu conheço.
É uma coisa típica dos portugueses, como diria o meu assistente "deste país", que não tenhamos problemas em criticar mas raramente queiramos perder tempo a educar.
Se há falta de cultura e de informação, quem a tem tem o dever social de ser didático em tudo o que faz.
E agora como diria o Júlio Isidro numa das suas primeiras aparições, ainda adolescente, na TV portuguesa: e por tudo é hoje. Boa noite.
é curioso como o preconceito se dá nas coisas comezinhas. o ranço, a gastura de ver uma ex colônia indo muito melhor das pernas que Portugal deve mesmo incomodar demais. Livros brasileiros são um universo tão grande que não podem , Senhora Sofia, ser julgados apenas segundo vossa pequena e certamente limitada experiência. Mas é ótimo mesmo que espaços democráticos como esses dêem voz aos seus preconceitos de maneira a revelar-se diante de todos com sua xenofobia. A lingua portuguesa tem muitos modos de usar! Angola, Cabo Verde, Timor,Portugal, Moçambique, Brasil usam a língua com seu jeito local; transforma-na. A língua é dos falantes, é viva! E isso é mesmo lindo, é lindo ver os múltiplos sentidos e as particularidades da nossa língua, mas isso é coisa que só quem tem o peito aberto pode ver. Só quem tem beleza por dentro sabe apreciar.
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