Foi uma daquelas coisas. Um dia pus-me a pensar: quem, de entre aqueles génios do cinema, poderia ter escrito um grande livro? Orson Welles foi o nome que me surgiu de imediato. Atirei-me à Amazon descrente para ser surpreendido. Havia um livro, melhor - um romance!
Depois surgiram as questões: terá sido mesmo Welles a escrever o livro? O seu secretário? Terá Welles ditado o livro a outra pessoa? Sabe-se apenas de onde veio a base da história: do grande filme que Welles nunca realizou. Com efeito, a meio da realização de Mr. Arkadin, Welles viu serem-lhe cortadas as pernas (a nível orçamental). Esteve para repudiar o filme e retirar o seu nome. Este livro, publicado poucos anos depois tem por base as notas de Welles que pretendia ultrapassar «Citizen Kane» e criar o fresco da sociedade contemporânea e de todo o século XX vivido até à altura.
A ideia da investigação do passado obscuro de um multimilionário internacional amnésico cruzava personagens do «Terceiro Homem» de Graham Greene e da continuação das aventuras de Harry Lime que Welles desenvolvera em novela radiofónica. Mas outros personagens de outros filmes, de outras produções radiofónicas de outras obras literárias cruzariam o enredo construindo um retrato panorâmico inigualável.
A maestria com que está escrito é, também ela, inegável o que demonstra a mão presente e firme de Welles. Se todas as palavras são suas ninguém o virá a saber mas que a importância do livro para a compreensão do homem e do seu tempo e, a um nível mais geral, a relevância da obra em termos literários ecinematográficos - em termos culturais no geral - é algo indiscutível.
Venham conhecer esta «sórdida vida secreta» do século XX.
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6 comentários:
É falso. Orson Welles nunca escreveu o livro, foi Maurice Bessy. Leia "This is Orson Welles", onde a história é contada pelo próprio ao Peter Bogdanovitch, e, já agora, leia isto: http://www.wellesnet.com/?p=1230
Não use o nome de Welles para ganhar dinheiro, sobretudo em coisas de que ele não foi o directo responsável. Shame on you, Ulisseia e Sr. Editor.
Luísa Telles V.
Lisboa
Cara Luísa,
O contrato de direitos obriga-me, como à editora original, a usar o nome de Welles (será que foi um meio do tal Maurice Bessy ganhar dinheiro? - shame on him).
Em segundo lugar John Baxter no prefácio a esta edição explica as muitas dúvidas sobre essa autoria, afinal Bessy só o afirmou após a morte de Welles.
É sempre melhor não acusar sem saber pois pode ficar-se mal visto, não acha? Chamar alguém de mentiroso e dizer o que diz é feio. Não escondo os meus contactos, para a próxima vez que achar que eu tenha lesado a cultura, escreva-me ou telefone. hugo_xavier@yahoo.com
Caro Hugo, já devia saber que a Amazon não chega como fonte para a descoberta de livros e, sobretudo, como referência fiável para os mesmos. Sobre esse Baxter deveria ter consultado a página do Wellesnet que lhe sugeri (http://www.wellesnet.com/?p=1230) ANTES de ter traduzido e publicado o seu prefácio. Passo a citar:
"Harper Collins has come out with a trade paperback edition of the novelization of Orson Welles’s movie Mr. Arkadin, which contains a new Foreword by John Baxter. Jonathan Rosenbaum has written an essay about the book for the Barnes and Noble website, noting that “Baxter’s Foreword, which starts off quite reasonably, winds up with the usual boilerplate vilifications, claiming without much basis that Welles habitually walked away from films when the budgets ran out, ended his life on charity, and, ‘For diversion, he dined out — always assuming someone else picked up the check.’ ”
Given Baxter’s penchant for getting his facts incorrect, it would seem there would be little reason to buy the book, since the marvelous Criterion DVD set includes the novel along with a much better preface by Robert Polito."
Ou seja, era este prefácio de Robert Polito (publicado pela Criterion, que está acima de qualquer suspeita, na sua edição do DVD), e não o de Baxter, que devia ter publicado. E devia saber que o Jonathan Rosenbaum esteve associado à edição do "This is Orson Welles", em estreita colaboração com o Peter Bogdanovich, que recolheu todos os depoimentos de Welles em primeira mão. Logo, se o Rosenbaum diz que o Baxter não é fiável, é porque não é.
Informe-se antes de encher a boca e as capas dos livros com nomes sonantes apenas para vender papel. Os leitores merecem mais respeito, e os meios de que dispõe na Ulisseia não serão parcos, convenhamos.
Luísa Telles V.
Lisboa
Mas, sabe, o que mais me assusta é notar que o Hugo desconhece o conceito de "novelização": versões romanceadas dos argumentos de filmes, publicadas depois da estreia desses filmes. Tenha cuidado, porque há coisas muito estranhas por aí. Por exemplo, a novelização do filme "The Swimmer" de Frank Perry (1968) está assinada pela sua mulher, Eleanor Perry, quando o filme é na verdade uma adaptação do conto de John Cheever. Olhinho aberto, Sr. Editor.
LTV
"será que foi um meio do tal Maurice Bessy ganhar dinheiro?"
O "tal" Maurice Bessy foi apenas um dos primeiros, senão o primeiro biógrafo do Welles. E se pensar bem, chegará à conclusão de que terá sido um "meio" para o Welles ganhar dinheiro para acabar o filme (ou seja, o nome do Welles neste livro foi apenas uma forma de atrair atenção para o filme; com o título "Mr. Arkadin" ou "Confidential Report" o Welles escreveu apenas o ARGUMENTO).
Leia antes de editar. É um dos mais velhos mandamentos do meio.
LVT
lx
Cara Luísa, terá razão certamente nos seus argumentos mas eu estou confinado a um contrato de direitos que me obriga, no sentido da publicação a manter esta mística. Na Cavalo de Ferro publiquei os livros de Botul, um autor inexistente, uma fraude criada para efeito cómico. Mas quer aí quer no livro que agora abordamos e que li, tinha de tomar a decisão: publicar ou não. Como o faria a Luísa: não publicava o livro ou publicava-o mantendo o mito?
Eu gosto de mitos, eu gosto de lendas que os autores gostam de criar. Não estaríamos a atraiçoar Welles e Berry se desrespeitássemos a vontade de ambos em que o autor aparecesse como Orson Welles?
Sou um editor, se os contratos dos livros me obrigam a seguir determinados trâmites tenho duas hipóteses que já referi, a de me tornar um arauto da verdade contra o desejo dos autores é a via não viável.
Cabe aos livros clarificar a história dos livros, Daí que eu tenha escolhido publicar este, poderia também ter publicado a biografia de Berry que não conheço. Essa é a função dela: desmitificar. Esta é ludibriar.
Não serei eu a julgar.
A história da literatura está cheia de logros, mitos, pseudónimos, heterónimos e até de ghost writers - alguns melhores que as personagens reais a quem dão voz. São opções. se tem de se queixar a alguém fale com os herdeiros de Welles ou de Berry, afinal são eles a intentar este crime de lesa-leitor.
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