2012

0 comentários sábado, 31 de dezembro de 2011
Caros,
Mais do que qualquer outra coisa queria desejar a cada um, neste 2012 que espreita, a crise que cada qual merece. Desejar muito sériamente que a crise que não fizemos por merecer não nos bata à porta. Mas como também imagino que acabe por bater, desejar para todos vós saúde, comida, amigos e muita força.
Acho que 2012 vai ser um ano de limpeza, tudo o que estava podre vai acabar por cair e isso significa básicamente cair tudo, mas será também o ano em que vamos ver surgirem novas ideias, projectos, empresas e pela primeira vez em anos haverá uma real preocupação em reunir a competência aliciando-a a participar activamente nesses projectos.
A incompetência sufocante, aquela que abafa o real valor por insegurança e incultura, tem de desaparecer caso contrário desaparece o país, o continente.
Esta revolução, porque o é, passa por cada um. Tem que ver com o grau de exigência que colocamos em tudo o que fazemos. Não podemos desligar-nos e continuar a apontar responsabilidades a quem manda. Quem manda está no poder porque nós enquanto povo neles votamos e se não vemos entre eles alternativas viáveis, mudemos o sistema, ofereçamo-nos nós, recomendemos quem deveria...
A nossa responsabilidade é responsabilizarmos, a começar por nós próprios; é exigirmos, a começar por nós próprios; e é suar, a começar por nós próprios.
Mais do que meias-horas adicionais, férias a menos ou subsídios eliminados, a competência e a avaliação por mérito são a salvação do país.
Ficaria muito contente se isto acontecesse.
Que 2012 seja o ano de mudança porque nós a queremos e não por outro motivo qualquer.
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Os outros livros do ano 2011

0 comentários sábado, 17 de dezembro de 2011
Agora que estou desempregado, de novo, posso fazer coisas como escolher o top 10 dos livros que publiquei em 2011.

Assim e começando pelas menções de honra:

Com o corpo todo - de Paulo José Miranda - Ulisseia

Para mim como editor foi um prazer poder em primeiro lugar trazer de volta aos escaparates um autor que acho ser da maior importância no passado recente da literatura portuguesa, por outro lado a obra em si é um grito lancinante sobre uma geração que usa o sexo como forma de comunicação quando as palavras falham. É um romance selvático e quase primário na forma como descreve os laços mais frágeis que nos unem e a forma como por vezes nos esforçamos para os estilhaçar face à nossa dificuldade de lidar com o outro.

A última criança - de John Hart - Ulisseia - trad. Carmo Vasconcelos Romão

Uma das questões que me coloquei enquanto editor foi em que chancela deveria publicar este romance.
trata-se essencialmente de um thriller. Uma obra vencedora do Edgar Award (o mais prestigiado prémio para literatura policial nos EUA) e do Silver Dagger award (o congénere inglês).
Aquilo que me levou a decidir pela Ulisseia foi a importância social do livro. É certo que é um romance de suspense, uma obra empolgante que usa as fórmulas do romance policial e do thriller mas não deixa de ser um alerta poderoso para as fragilidades sociais que se tornam ainda mais evidentes em momentos de crise.

Viagens Brancas - de Ana Cristina Pereira - Arcádia

Sobretudo um livro no qual me orgulho de ter participado. Uma obra importante da mais importante jornalista a trabalhar hoje sobre questões sociais.
Cada capítulo uma pequena história (verídica) que liga a mulher ao mundo da droga, seja como mão, traficante, vendedora, filha, familiar, vizinha ou toxicodependente.


E agora os 10 melhores.

10.
Noite de Primavera - de Tarjei Vesaas - Ulisseia - trad. Mário Semião

Uma obra que editorialmente demorou a parir. Foi quase ano e meio e no entanto está aqui. Um dos grandes autores nórdicos nunca publicado em Portugal antes. Este é um buildung roman mas muito pouco comum. Está lá a perda de inocência, está lá a consciencialização de um mundo falhado mas há muito mais. Na história de Sissel e do seu irmão que recebem por uma noite uma família perdida e muito disfuncional, está uma alegoria dos nossos tempos. Escrita com uma linguagem cristalina e uma poesia imediata que fazem dele um dos grandes romances do nosso tempo e revelam bem porque é que Vesaas foi três vezes candidato ao Nobel.

9.
Os armário vazios - de Maria Judite de Carvalho - Ulisseia

Não me alongarei muito sobre mais um livro que é mais uma obra-prima da literatura portuguesa do século XX. Quem me conhece sabe o fascínio que nutro pela escrita de Maria Judite de carvalho e portanto imagina o prazer que foi poder trazer de novo à luz do dia este grande livro.
Como todos os livros de MJC, este fala-nos sobre a solidão, a ausência, o silêncio no meio das mil palavras. Mas como é já hábito mais do que o enredo ou qualquer outra coisa, a escrita é a principal personagem.

8.
15 dias de febre - de Maria do Carmo Castelo Branco - Verbo

Há uns anos atrás li a grande biografia de Baron Corvo por A. J. A. Symons que é considerada pela teoria literária como uma das mais inovadoras experiências em biografia pós-moderna.
acontece que esta biografia, escrita pela neta de Camilo, esta auto-psicografia escrita por outra pessoa vai muito mais longe. Enquanto obra literária é esmagadora, poderosa, diferente.
É um grande livro para uma esmagadora minoria.

7.
A pirâmide - de William Golding - Ulisseia - trad. João Cruz

Considerado pela crítica como o romance mais biográfico do prémio Nobel britânico, «A pirâmide» É também o mais humano dos romances de Golding; aquele que nos fala do ponto de vista, das nossas limitações e dos preconceitos sociais, aquele que nos fala claramente sobre a incapacidade de vermos o todo que nos rodeia e de nos vermos a nós mesmos fora de nós.
Mas é o mais divertido dos livros, o romance que segue um jovem protagonista numa clássica aldeia inglesa que decide não ser moleiro, oleiro, ferreiro, agricultor e sim ser artista. Os dados estão lançados. As gargalhadas vão soltar-se mas o que o romance nos conta, lá bem no fundo, é muito mais negro.

6.
Uma espécie de sono - de Henry Roth - Ulisseia - trad. de Miguel Martins

Hoje descobri que o Rogério Casanova tinha eleito este romance como um dos livros do ano de 2011. Na crítica que lhe fez, apontou o mesmo e único defeito que lhe vejo, defeito típico de todos os livros fundadores de um género, estilo ou corrente: aquilo que contém foi já trabalhado posteriormente e transformado em algo mais.
O livro de Henry Roth é um «Ulysses» - aliás têm sido comparado à obra de Joyce - , provavelmente o primero grande romance moderno, polifónico, polimórfico, que acompanha a vida de uma criança filha de emigrantes nas primeiras levas a chegar aos EUA no começo do século XX. Para a capa escolhemos uma fotografia que revela uma das fases de construção da estátua da liberdade que chegou em peças oferecida pela frança. O livro é também isso: um imenso puzzle sobre as peças que entram quer se queira quer não, na construção de uma pessoa num tempo e num país também eles em construção.

E fica também uma nota para a tradução impossível do Miguel Martins.

5.
Brutal - de Fernando Esteves Pinto - Ulisseia

Várias coisas obrigaram-me a publicar este livro. A primeira delas será o facto de em anos de receber milhares de originais, ver pela primeira vez um original que, à excepção de ligeiras correcções de texto, não precisava de nada. Era uma obra perfeita em si. O segundo motivo está em que esta é uma obra diferente de tudo quanto se pode ler na moderna literatura portuguesa. Na sessãod e apresentação da obra, decorrida na Feira do Livro, tive oportunidade de o dizer. Há muito poucas literaturas no mundo que se possam orgulhar de ter objectos literários que não se encaixam bem em escola ou movimento nenhum e ainda assim são grandes obras. Cá em Portugal temos duas O «Húmus» de Raúl Brandão e este livro de FEP e o curioso é que em muitos pontos estas duas obras tocam-se sem se imitarem.

Este livro é um brutal retrato sobre as relações humanas através dos traumas sexuais e psicológicos. É uma obra dura, é uma obra violenta é um grande romance.

4.
Não verás país nenhum - de Ignácio de Loyola Brandão - Ulisseia

Loyola Brandão, o escritor brasileiro, não o Santo, venceu por duas vezes o Jabuti, o seu romance «Zero» é uma das grandes obras-primas da literatura mundial e foi escolhido como uma das 100 obras de língua portuguesa durante a Expo 98.
Sobre este livro vou apenas dizer uma coisa: não houve ninguém que o tivesse lido que não tivesse gostado muito.
É um grande romance: ecoógico, de aventuras, de amor, de ficção científica, de fantasia, de terror, policial, de crítica social, poético, um thriller... se há romances dos quais se pode dizer que têm tudo para todos os tipos de leitor (e não perdem por isso mesmo) este é, certamente, um deles.

3.
Bilhar às nove e meia - de Heinrich Böll - Ulisseia - trad. de Vanda Gomes

Eu nunca publiquei prémios Nobel por publicar, porque vendem mais ou porque "devem ser bons". A escolha tem de ser minha, isso é o que significa ser editor: saber escolher em funçaõ do público para o qual se está a trabalhar.

Achei que este era um romance necessário para a nossa sociedade actual e mais se tornou com o agudizar da crise. Böll traça as ruínas de uma sociedade desmoronada e o jogo de aparências que essa mesma sociedade procura manter. O humor é subtil e delicioso, a segurança da escrita, um primor.

2.
Uma parte do todo - de Steve Toltz - Ulisseia - trad. de Carmo Vasconcelos Romão

Será escusado dizer que é um grande romance, afinal ronda as 700 páginas...

Mas vou mesmo escrever pouco sobre este grande livro. Vou dizer-vos que, como leitor, foi um dos livros que mais prazer me deu ler nos últimos anos. Gosto de livros com grandes histórias, daquelas que pegam em nós e nos depositam sobre um berço e nos transportam em viagens incríveis. Há muito tempo que não lia um livro que conseguisse isso de forma tão plena.

Para aqueles que têm mesmo de saber alguma coisa da história: é uma saga familiar que acompanha uma família que se propõe estar à altura da tradição de uma Austrália colonizada enquanto prisão do Reino de Sua Majestade: o objectivo dos vários membros desta família é serem os piores possível. Uma família disfuncional? Nem tando... leiam e deliciem-se.

1.
Satã em Goray - de Isaac Bashevis Singer - Ulisseia - trad. de João Carlos Alvim

Em primeiro lugar andava há anos a tentar deitar a mão a Singer e trazê-lo à edição em Portugal com o rigor que merece. Em segundo lugar é um grande livro.

Pleno de simbolismo, pleno de paralelismos históricos, pleno de importância nos dias que correm.

Romance histórico que acompanha uma pequena aldeia judaica do século XVI no territóriao actualmente correspondente à Polónia, uma aldeia que acaba de sobreviver, com muitas mazelas, aos ataques dos cossacos. Uma aldeia que se prepara para o Inverno rigoroso sem quase nada que comer. Uma aldeia à qual chega um personagem estranho que se diz profeta.

O livro foi escrito pouco antes e publicado pouco depois da fuga de Singer para os EUA no final dos anos 30, ameaçado que se sentia pelo regime Nazi em ascensão.

***

Para breve ficam prometidas as minhas escolhas do ano do que se andou a publicar por cá neste país em crise. Foi um rico ano, verdade seja dita.
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